23 de maio de 2015

FESTA DE PENTECOSTES

O dom do Espírito é a última palavra, o coroamento do percurso pascal de Cristo. Após este dom, começa a longa caminhada dos discípulos e da humanidade rumo à perfeição da criação, o “Tempo Comum”. Este é um tempo cheio do Espírito. E, pelo Espírito, o Cristo se torna interior a nós, a tal ponto misturado conosco que dificilmente é identificável: mais íntimo a nós do que a nossa própria intimidade. Temos aqui, a seguir, alguns temas e imagens escriturais que podem nos permitir progredir na inteligência do Espírito.
Primeiro, as línguas
Um fogo que se repartiu em línguas (Atos 2,3): a unidade fez-se diversidade. Isto quer dizer, sem dúvida, que a Unidade divina é rica por demais, para exprimir-se conforme um modelo só. É como o corpo humano: o homem novo é um organismo, é a organização e unificação de uma multiplicidade. Um só é o Espírito, e as línguas todas, uma diversidade. Uma só, a equipe apostólica, e a totalidade das nações.
Tem-se observado com frequência que Pentecostes anula a divisão provocada em Babel pela vontade humana do poder (1ª leitura da Vigília). Estamos sempre convidados a passar do regime de Babel ao regime do Espírito pela constituição deste Corpo de que nos fala a segunda leitura do dia. O espetáculo é com certeza menos grandioso do que o do dom da Lei, em Êxodo 19.
O texto de Atos fala, no entanto, de “um barulho como se fosse uma forte ventania” e de “línguas como de fogo que se repartiram e pousaram sobre cada um deles”. É que passamos do estado de submissão à Lei, ao estado de liberdade no Espírito. A nova Babel faz-se acompanhar de um novo Sinai. Daí em diante, seremos movidos pelo Amor que é o liame da Trindade. A Lei será então perfeitamente observada e cumprida, mas não mais em nome da Lei, e sim pela força do amor.
O vento violento
No 2º capítulo do Gênesis, vemos o homem feito de argila ser animado pelo próprio sopro de Deus, sopro que significa a respiração, mas também a vida. Sopro de Deus que pode tornar-se vento violento, para secar as águas do dilúvio ou separar em dois o Mar Vermelho; ou então um sopro novo, para uma vida nova (Ezequiel 36,26-27); ou a leve brisa que revela a presença divina para Elias (1 Reis 19,12). Jesus irá dizer que os que nasceram do Espírito são como o vento, que sopra onde quer (João 3,8). No evangelho de hoje, Jesus repete o mesmo gesto com que Deus animou Adão: comunica o seu sopro aos discípulos. Os Atos contentam-se com falar de um “barulho como se fosse uma forte ventania”. Todas estas figuras querem significar: vida, mobilidade extrema, liberdade.
A alegria
A “Sequência”, localizada entre a 2ª leitura e o evangelho, apresenta-nos o Espírito como sendo a luz e o operador de tudo o que Deus realiza em nós e por nós. Este texto termina falando na "alegria eterna". No discurso após a Ceia, o Espírito é chamado muitas vezes de defensor, de advogado de defesa que é quem sustenta, encoraja e assiste o seu cliente no decurso de um processo. Tudo isso nos diz que a vinda do Espírito se manifesta por uma inundação de alegria, o que os autores espirituais chamam de "consolação". Muitas vezes falamos de Deus como de um juiz, que retribui a cada um conforme as suas obras, mas esquecemos facilmente o fato de ser este mesmo Deus o nosso defensor.


Marcel Domergue é jesuíta. O texto é baseado nas leituras do Domingo de Pentecostes (24 de maio de 2015). A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
Fonte: http://www.domtotal.com/

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